A prevalência de problemas decorrentes do uso de álcool entre idosos é preocupante. a informação é da médica pesquisadora do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), a psiquiatra Nathália Klein. O Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), desenvolvido pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas do Álcool e Outras Drogas (Inpad) e pela Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (Uniad), constatou em 2013 que 7% da população brasileira acima dos 60 anos faziam uso diário de álcool. Saiba mais sobre o trabalho do CISA no site.
Diante do crescimento da população idosa nos últimos anos, Nathália acredita que este percentual tenha crescido: “Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD, 2018) mostram que a população brasileira manteve a tendência de envelhecimento. Houve um ganho de 4,8 milhões de idosos (com 60 anos ou mais) de 2012 a 2017, chegando a 30,2 milhões. Isso corresponde a um crescimento de 18% desse grupo etário, que tem se tornado cada vez mais representativo no Brasil. Isso contribui para o aumento da prevalência do uso de álcool em idosos”. Veja mais nesta entrevista ao blog.
Nova Maturidade: Quais os principais problemas causados pelo consumo excessivo do álcool? Eles se agravam com o envelhecimento?
Nathália: Nos idosos, o álcool pode contribuir ainda para um maior risco de quedas e desenvolvimento de doenças crônicas comuns a essa faixa etária, como diabetes, hipertensão, entre outras. Para aqueles que usam medicamentos tranquilizantes, analgésicos, sedativos, estimulantes e antidepressivos, o uso de álcool aumenta o risco de efeitos colaterais e pode influenciar na efetividade do tratamento. O uso abusivo de álcool pode ainda acelerar o processo normal de envelhecimento do cérebro, aumentando a perda de tecido cerebral e a diminuição de massa dos lobos frontais, responsáveis pelo planejamento de ações, pelos movimentos e pelo pensamento abstrato.
Nova Maturidade: O risco de dependência é maior na vida adulta?
Nathália Klein: Quando o idoso começa a beber já na idade adulta o risco de desenvolver dependência é menor. O uso precoce de álcool, desde a juventude, contribui para um maior risco de se tornar dependente de álcool. Isso também acontece em relação ao uso de outras drogas. O álcool pode ser um facilitador para o consumo de outras drogas, porém em idosos isso é mais difícil de acontecer. Geralmente são menos impulsivos, costumam ser mais prudentes e tendem a se preocuparem mais com a saúde como um todo.
Nova Maturidade: A tolerância ao álcool é afetada pelo envelhecimento?
Nathália: O envelhecimento pode diminuir a tolerância do corpo ao álcool devido a uma série de alterações fisiológicas: mudanças na capacidade de metabolização hepática e função renal, bem como na composição corporal, com maior tendência à desidratação. Assim, a ingestão de álcool em idosos pode provocar efeitos mais acentuados comparativamente aos jovens de mesmo sexo e peso. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), não existe nível seguro para o consumo de álcool.
Nova Maturidade: São mais homens ou mulheres dependentes? Os gêneros lidam de forma diferente com a dependência?
Nathália: Os transtornos relacionados ao álcool (abuso e dependência) em idosos estão mais associados ao sexo masculino e a ser economicamente desfavorecido. Em paralelo, as idosas representam um subgrupo que merece atenção específica. Para elas a progressão do uso à dependência tende a ocorrer mais rapidamente e as consequências adversas iniciam-se mais precocemente.
Nova Maturidade: Como combater a doença? As pessoas idosas têm maior dificuldade em aderir ao tratamento?
Nathália: A prevenção, nessa faixa etária, é fundamental. Os idosos dificilmente reconhecem o uso de álcool como um problema e por esse motivo têm maior dificuldade de aderir aos tratamentos. Tomar consciência do problema ajuda a aumentar a busca e a implementação de tratamento do alcoolismo. A atuação de uma equipe multidisciplinar e apoio familiar são as bases de um tratamento eficaz e duradouro.
NM: A relação das pessoas com a bebida alcoólica vem mudando ou não?
Nathália: Os efeitos desse consumo são mais intensos nos idosos em razão das alterações fisiológicas do envelhecimento. Entre 2010 e 2016, os idosos (55 ou mais anos de idade) apresentaram aumento no número de internações e óbitos parcial ou totalmente atribuíveis ao álcool, na contramão da população com menos de 54 anos, que apresentou redução nestes indicadores. A prevenção do uso nocivo de álcool é fundamental. O uso precoce de álcool, desde a juventude, contribui para o maior risco de se tornar dependente de álcool na idade adulta e consequentemente nos idosos. (Katia Brito / Imagem de Лечение Наркомании por Pixabay)