O cuidado é um desafio para profissionais e ainda mais para familiares. Entre os alunos do Curso para Cuidadores de Idosos, promovido pela Central Nacional Unimed em parceria com o Senac, pessoas que viveram ou vivem a experiência do cuidado em casa. E agora, em unidades como o Senac Tiradentes, no centro de São Paulo, buscam conhecimento para cuidar melhor, e principalmente ter o cuidado como profissão. Leia a matéria sobre o curso no link.
Ana Darc da Silva Ribeiro, de 42 anos, cuidou do pai que sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) aos 81 anos e morreu oito anos depois. “Eu tive dois motivos para fazer o curso: percebi que eu realmente queria cuidar de alguém e também o cuidado com meu pai”, conta. O pai morreu há um ano. Ela também quer estar preparada caso a mãe de 80 anos hoje independente possa precisar de cuidados.
Atualmente trabalhando com atendimento receptivo, Ana pretende depois do curso se tornar uma cuidadora profissional. “Esse curso é muito interessante. Eu passei horas chorando com as videoaulas e pedi perdão para o meu pai porque a gente não deu o tratamento adequado. Coisas que a gente não faz não é nem por negligência mas falta de conhecimento”, afirma.
Outra questão trazida pelo curso, segundo Ana, é a preocupação com o próprio envelhecer: “A gente sempre pergunta o que nós estamos fazendo para o nosso envelhecimento. Eu já comecei. Na minha casa a alimentação mudou radicalmente. Quero chegar aos meus 80 anos com saúde, passeando, fazendo minhas corridinhas de fim de semana, super bem”. Ela acredita que os governantes deveriam dar prioridade nos tratamentos e atenção aos idosos.
Envelhecer
Um dos estímulos para a massoterapeuta Sandra Aparecida Pinheiro dos Santos, de 56 anos, procurar o curso foi o cuidado com o senhorio do local onde mora. O abandono da família, segundo ela, levou o senhorio a uma grave depressão e as consequências da doença o deixaram praticamente acamado por cerca de seis meses. Neste período foi Sandra quem cuidou dele. Hoje ele é cuidado por um familiar, mas ela ainda o auxilia e é um contato para qualquer emergência.
Perto dos 60 anos, idade em que pelo Estatuto do Idoso somos considerados idosos, Sandra também busca aprender sobre o próprio envelhecimento. “Todos os dias nós envelhecemos. Então os cuidados que eu quero ter com as pessoas, são os cuidados que se eu vier a precisar que tenham comigo. Acho que para cuidar você tem que gostar, tem que ter amor, dedicação, paciência e compreensão”, avalia.
Aceitar o envelhecer foi uma dos aprendizados do curso para Sandra. “Esse curso foi também aceitar o envelhecimento, porque não é todo mundo que aceita. Começam os cabelos brancos e a gente quer pintar de preto, começa a ter dificuldade de lembrar e já pensa que é Alzheimer, e não é assim. Somos seres humanos, a gente não é perfeito e tem medo daquilo que vem pela frente”, destaca.
A qualificação dos cuidadores, na opinião de Sandra, vai contribuir para o fim da discriminação, especialmente no Sistema Único de Saúde (SUS). “É preciso fazer uma sociedade mais responsável. No SUS pacientes chegam sozinhos e há discriminação. Já presenciei isso contra pacientes com Alzheimer. Acho que quando perceberem que tem muita gente se formando, cuidando, com interesse, eles vão acabar mudando o modo de tratar as pessoas, os idosos em geral, e também a família talvez não abandone tanto”, acredita.
Mãe da mãe
Isabel Patrícia Lacerda, de 51 anos, também aluna do curso, estava terminando a Faculdade de Direito quando a mãe sofreu um AVC aos 75 anos. Depois de cinco anos, a mãe faleceu. “Eu atuei cinco anos cuidando da minha mãe. Eu fui pega assim de surpresa quando ela teve um AVC. Você tem que trabalhar e tentar entender e aceitar que a pessoa está precisando da sua ajuda, que ela não vai fazer mais as coisas que fazia”, conta.
Isabel viveu os cinco anos em função da mãe: “ Eu cuidei sozinha da minha mãe, tive que parar tudo que eu fazia. A gente fala muito cuidador do idoso, mas a gente tem que pensar no filho cuidador. O filho cuidador sofre muito, tem uma sobrecarga grande. Fui cuidadora 24 horas por dia e depois fiquei dois anos para tentar sair da depressão depois que ela faleceu”.
O objetivo de Isabel é trabalhar como cuidadora. Para ela, é preciso influenciar a todos para se envolverem no cuidado com o idoso, abraçando principalmente a família. Ela aponta a necessidade de entendimento que todos possam para ser mais flexíveis.
Vivência
Regilma Delrei Oliveira, de 49 anos, vive o cuidado todos os dias com a filha de 20 anos com autismo severo, o pai de 87 anos e o padrasto de 82 anos que tem trombose. Além do Curso para Cuidadores de Idosos, ela em breve se formará como auxiliar de enfermagem e pretende estudar Gerontologia. “Acho que o aprendizado é tudo. Você aprendendo a fazer corretamente, não se sobrecarrega tanto, fica mais fácil. Por isso que eu vim, busquei melhorar. É muito difícil lidar com o idoso”, afirma.
Participar do curso é maravilhoso, de acordo com Regilma, e a ajudou a dar mais atenção para os pais. “O curso me ajudou a lidar, a entender o que fazer com eles. A minha paciência estava acabando, estava no meu limite, não sabia como conversar com eles. Com o curso eu comecei a dar mais atenção, a cuidar. Não foi fácil chegar aqui hoje”, salienta.
O padrasto foi quem criou Regilma, enquanto o pai a abandonou. “Quando meu pai verdadeiro envelheceu meu irmão e as outras filhas dele não quiseram saber, mas eu falei: ‘não, a gente não paga o mal com mal’. Eu trouxe pra dentro da minha casa”, conta. Já o padrasto ficou sozinho depois que a mãe de Regilma faleceu e quando ficou doente ela o acolheu também. Depois de um dia inteiro no curso para cuidadores, ela iria para a casa do padrasto que é no mesmo quintal de sua casa, sentar com ele para dar atenção e conversar, depois fazer o mesmo com a filha e com o pai.
Agradeço muito a estas mulheres por compartilharem suas histórias comigo durante a aula do Curso para Cuidadores de Idosos no Senac Tiradentes no sábado, dia 19 de outubro. Um prazer conhecer mulheres tão fortes e batalhadoras. Na foto principal, Ana, Sandra e Isabel (deitada) na aula prática. Saiba mais sobre o curso no link. (Katia Brito)