Nova Maturidade

Conscientização sobre quedas deve envolver idosos, cuidadores e profissionais de saúde

Idosos, cuidadores, familiares e profissionais de saúde devem atuar em conjunto para que as ações para prevenção de quedas de pessoas idosas sejam realmente eficientes. É o que afirma Rosamaria Rodrigues Garcia, fisioterapeuta, especialista em gerontologia pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) e mestre e doutora em saúde pública.

Nesta semana em que se comemora o Dia Mundial de Prevenção de Quedas, celebrado no dia 24 de junho, o blog Nova Maturidade traz uma reportagem sobre medidas preventivas (leia aqui) e esta entrevista especial com a profa. dra., que é diretora técnica da Gerência Especializada em Gerontologia do Instituto Paulista de Geriatria e Gerontologia (IPGG) José Ermírio de Moraes.       

Nova Maturidade: A questão da prevenção de quedas vem ganhando mais importância?

Rosamaria Rodrigues Garcia (foto): Se a gente for analisar algumas décadas, a queda se quer era mencionada na mídia. As pessoas nem davam importância, nem profissionais médicos e não médicos, era uma coisa totalmente esquecida. Existe um modelo muito medicocêntrico, voltado para a doença, e isso fazia com que pessoas não se preocupassem muito com a queda porque teoricamente ela era não era doença. De alguns anos pra cá, principalmente nos últimos 10, 15 anos, alguns órgãos, equipamentos, a sociedade cientifica e organizações internacionais, começaram a despertar para isso e instituíram o Dia Mundial de Prevenção de Quedas até como uma data para conscientizar em massa as pessoas.  

NM: Como você avalia a importância de termos esta data?

Rosa: Eu acho que isso é importante. Apesar das quedas acontecerem todo dia, a cada minuto, é importante você ter a data porque conseguir chamar a atenção da população em massa. Da mesma forma que acontece com a violência (15 de junho é Dia da Conscientização da Violência contra a Pessoa Idosa) ou pra AVC (Acidente Vascular Cerebral – 29 de outubro é Dia Mundial de Combate) e assim por diante, a data em si traz a oportunidade de uma conscientização em massa naquela semana e isso, com o passar do tempo, acabou chamando a atenção dos profissionais, dos serviços e do próprio governo também. Com muito custo essas datas, essas iniciativas foram se tornando exitosas por conta disso.

NM: Atualmente as atividades estão suspensas, mas o IPGG realiza a Semana de Prevenção de Quedas. Como vocês desenvolvem este trabalho?

Rosa: É importante a gente tornar essas ações de prevenção de quedas permanente, e isso aconteceu no IPGG com grupos de prevenção de quedas e de equilíbrio, que são permanentes. A gente entende que focar a semana e trabalhar várias e várias ações, isso faz com que a gente consiga trabalhar melhor as várias dimensões da queda, perpassando ao longo da semana por todas essas esferas tanto o idoso, quanto o cuidador, a família e profissional da saúde da atenção primária que está lá na ponta, o da secundaria que é especializada, e o da terciaria porque as quedas também acontecem dentro dos hospitais.

NM: Qual o papel do idoso, dos cuidadores e familiares neste processo?

Rosa: Você precisa trabalhar com prevenção de queda com o próprio idoso, ele precisa se conscientizar. Muitas vezes o idoso não se identifica como um potencial caidor, e o quanto isso é perigoso. Se ele não se identifica, não vai se preocupar em adotar nenhuma medida de prevenção. Você precisa também conscientizar o cuidador a respeito da importância das medidas de prevenção, não só do ponto de vista de fatores extrínsecos (ambientais). Por exemplo, se o idoso mora com o filho, com a família, eles precisam aceitar essas modificações ambientais, mas também de levar esse idoso no programa de exercícios, para que ele possa praticar exercícios de equilíbrio, fazer treinamento de forca muscular, e que o médico possa fazer ajuste de medicamentos se necessário.

NM: Como é a adesão dos idosos aderem a estes programas permanentes?

Rosa: A gente ainda precisa avançar muito, ainda tem muito idoso caindo. O que percebemos percebe na literatura é que ele não deixa de cair, na verdade você pode ter uma diminuição do número de lesões, mas não necessariamente diminui o número de quedas, isso pra gente é um desafio. A ideia é que esse idoso possa incorporar ao longo do tempo essas medidas de prevenção e trabalhar a questão da manutenção. Vamos supor o Programa Multidimensional de Prevenção de Queda prevê exercícios desafiadores de equilíbrio. Vai chegar um momento que será orientado a fazer atividade física regular e continuar os exercícios em casa. É totalmente possível, porém requer disciplina, adesão, conscientização sobre a importância disso. Precisamos avançar bastante para entender os motivos pelos quais os idosos aderem ou não a esses programas tanto dentro dos serviços como fora como medida de manutenção.

NM: E os profissionais de saúde, qual o papel deles na prevenção?

Rosa: A família precisa participar desse processo de prevenção de quedas e os próprios profissionais de saúde, fortemente a gente tem feito já no IPGG há mais de 10 anos um trabalho de conscientizar profissionais da atenção básica principalmente, mas também da atenção especializada e até mesmo da atenção terciária. Os hospitais recebem os idosos com as consequências graves das quedas, como por exemplo a fratura, o traumatismo craniano, e se ele também não fizer nada, talvez esse idoso volte para casa, e dali um ano ele cai de novo e acaba até indo a óbito por conta disso.

NM: Qual o objetivo dessas ações com profissionais de saúde?

Prevenção de quedas entrevista Rosa IPGG Profissionais de saúde
IPGG capacita profissionais de saúde para prevenção de quedas (Imagem de Anh Nguyễn Duy por Pixabay

Rosa: Nosso papel no IPGG é de fomentar a realização de ações de prevenção de quedas pelo pessoal da atenção básica, secundaria e terciária ao longo do ano. A gente não quer só que a pessoa pense em prevenção de quedas naquela semana, a gente quer capacitar os profissionais para que eles sejam autônomos e consigam desenvolver ações de prevenção ao longo do ano inteiro, quer seja no hospital, na Unidade básica, na URSI (Unidade de Referência à Saúde do Idoso), em qualquer lugar. O idoso cai todo dia, não adianta fazer ações apenas uma vez no ano. A gente quer que as unidades e os serviços implementem ações que sejam contínuas, permanentes, essa é nossa missão, o nosso objetivo.

NM: Como você avalia o resultado desse trabalho com os profissionais?

Rosa: Se a gente avaliar os últimos 15 anos, houve uma sensibilização bastante importante. Hoje em dia é difícil você ir em uma Unidade Básica e os profissionais desconhecerem completamente a temática de quedas. Pode ser que não tenham ainda ações sistematizadas de prevenção, mas eles conhecem a temática e acho que isso já é um avanço. Outro avanço fantástico é a questão da inclusão da pergunta: ‘você já sofreu uma queda nos últimos 12 meses?’ na Avaliação Multidimensional da Pessoa Idosa (AMPI), que foi implementada pela equipe do dr. Sérgio Paschoal na Prefeitura de São Paulo. Agora as pessoas identificam e elas são obrigadas minimamente a dar um encaminhamento, a fazer algo por esse idoso.

NM: Atualmente há dispositivos e aplicativos voltados para a prevenção de quedas. A tecnologia pode ser uma aliada?

Rosa: Sempre vem somar, mas nós do IPGG ainda estamos capacitando esses idosos para que eles possam ter acesso a essas tecnologias. Um dos desafios no Brasil é lidar com as taxas elevadas de analfabetismo ou de analfabetismo funcional entre a população idosa, isso muitas vezes é um dificultador na utilização desses aplicativos. Embora a gente também tem visto um avanço, os idosos têm se inteirado das tecnologias e utilizado mais, as famílias têm ajudado, mas eu acho que esses aplicativos ainda precisariam ser mais divulgados, mais disseminados pelos próprios equipamentos de saúde e a mídia para que as pessoas tivessem mais conhecimento e de fato fizessem uso dessas tecnologias.

NM: Quais são os próximos passos para que a prevenção de quedas tenha o destaque merecido?

Rosa: Algumas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) implementaram programas de prevenção de quedas, e eu acho que a gente tem que caminhar agora para um segundo momento e avaliar a eficácia desses programas. O idoso está deixando de cair ou está caindo menos? Está se machucando menos quando participa desses programas? Esses programas estão contemplando todos os aspectos da prevenção de quedas? Mas isso é um segundo momento, eu considero sim que a gente avançou e as pessoas estão bem sensibilizadas, têm bastante conhecimento.

NM: E a mídia tem evoluído ao abordar a prevenção?

Enquanto se fala muito em fatores ambientais, alterações visuais podem causar quedas (Imagem de Alessandro Squassoni por Pixabay

Rosa: A temática está sendo bastante divulgada pela mídia, embora eu continuo com aquela critica. A mídia vem falar de tapete, de piso e na verdade você tem que falar de visão, de uso de psicotrópicos, de fraqueza muscular, de doenças prévias que precisam ser controladas. É preciso voltar o olhar para os fatores intrínsecos que precisam ser mais divulgados para que as ações possam ser disparadas e as pessoas também possam se conscientizar sobre a importância dessas medidas. Por exemplo, cirurgia de catarata está disponível, porém tem muito idoso que morre de medo de fazer, que acha que não vai funcionar. Então é necessário tornar essa temática mais evidente na mídia para que isso seja desmistificado e as pessoas possam se beneficiar.  

NM: Falando do IPGG, como têm sido feito os atendimentos e acompanhamentos neste período de pandemia?

Rosa: Os médicos têm ligado para os idosos, feito consultas por telefone e familiares vêm buscar as receitas. Os profissionais não médicos efetuam ligações para saber como eles estão, se precisam de alguma coisa. A gente tem produzido alguns materiais educativos, vídeos. Infelizmente é um grupo que corre um risco muito grande. A gente nem tem perspectiva, talvez sejamos um dos últimos grupos a voltarem, principalmente nas atividades de convivência.  

(Katia Brito / Imagem principal de Anemone123 por Pixabay)

Sair da versão mobile