Saúde, Assistência Social, Previdência, Moradia, Transporte, Cultura, Esporte e Lazer foram alguns dos temas trabalhados nos eixos temáticos da XV Conferência Estadual do Idoso. E são muitos os desafios para que a construção de políticas públicas e para as que já existem saiam do papel e façam realmente a diferença na vida das pessoas idosas.
Praticamente todo o segundo da conferência em Águas de Lindoia, no interior de São Paulo, foi dedicado aos debates nos eixos temáticos. O primeiro deles Direitos Fundamentais na construção/efetivação das políticas públicas, com os subeixos: Saúde, Assistência Social e Previdência, Moradia e Transporte, Cultura, Esporte e Lazer. Os outros foram Educação: assegurando direitos e emancipação humana (eixo II); Enfrentamento da violação dos Direitos da Pessoa Idosa (III); e Os Conselhos de Direitos: seu papel na efetivação do controle social na geração e implementação das políticas públicas (IV).
Nos eixos temáticos, delegados de diferentes municípios se dividiram em grupos para analisar e trabalhar as propostas vindas dos municípios. Os delegados são representantes da sociedade civil e do poder público eleitos nas Conferências Municipais. Dos 285 participantes na Conferência Estadual, 125 foram escolhidos para representarem o Estado de São Paulo na Conferência Nacional, que deve ocorrer em 2020.
Debates
Mas antes dos eixos temáticos, um acalorado debate para a aprovação do Regimento Interno no primeiro dia do evento. Aprovação que só veio no dia seguinte após a fala da presidente destituída do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (CNDI), Lucia Secoti. Ela destacou a importância da participação ainda mais diante da atual situação do CNDI, desconfigurado pelo Decreto 9893, de junho deste ano. O número de conselheiros foi reduzido e não há mais participação da sociedade civil.
Participar da XV Conferência Estadual do Idoso, podendo ouvir e aprender com pessoas como Lucia, entre outros especialistas, profissionais e delegados, foi extremamente gratificante. Ainda mais para quem ainda engatinha na área do envelhecimento. O blog Nova Maturidade completou em novembro seis meses de atividade.
Acompanhar os conferencistas, grande parte, idosos, realmente protagonistas, defendendo com veemência seus pontos de vista foi enriquecedor. E encontrando pontos de convergência para vencer o desafio de produzir consenso e trabalhar pelo ideal comum a todos ao fim da Conferência Estadual: construir propostas que possam se concretizar e efetivar quando levadas aos governos estadual e federal. Um exemplo desse trabalho efetivo presenciei no subeixo Moradia e Transporte, que acompanhei na terça, dia 12.
Palestras
Para auxiliar os delegados a definir as propostas nos eixos temáticos, a Comissão Organizadora preparou uma série de palestras. A primeira palestrante foi a profa. dra. Áurea Eleotério Soares Barroso, mestre em Gerontologia Social, doutora em Serviço Social pela PUC-SP e integrante da Pastoral da Pessoa Idosa. Segundo ela, políticas públicas visam dar resposta a problemas da sociedade demandados por meio da construção de agendas da sociedade.
Áurea citou o exemplo do Estatuto do Idoso, aprovado em 2003 após sete anos e meio tramitando no Congresso. De acordo com ela, uma novela da época (“Mulheres Apaixonadas”) contribuiu neste processo, trazendo a questão dos maus tratos a idosos e assim mobilizando a sociedade.
A definição trazida pela professora estabelece políticas públicas como sendo formadas por projetos, programas e planos que buscam determinados objetivos em áreas como educação, habitação, previdência, cultura, lazer, assistência social e saúde. E a participação da sociedade civil neste processo é fundamental, ocupando espaços como na Conferência Estadual. Para Áurea, o desafio está no reconhecimento social da contribuição dos idosos e no apoio às famílias e comunidades.
Saúde
Cláudia Fló, coordenadora técnica da área de Saúde do Idoso da Secretaria de Estado da Saúde, abriu o primeiro eixo temático: Direitos Fundamentais na construção/efetivação das políticas públicas. No subeixo Saúde, ela abordou a diferença entre a rede e equipamentos que formam o Sistema Único de Saúde (SUS), que inclui as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), Ambulatórios Médicos de Especialidades (AME), e o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), com o Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) e Centros Dias.
Na cidade de São Paulo há equipamentos voltados exclusivamente para as pessoas idosas como o AME Idoso nas regiões Oeste e Sudeste, o Centro de Referência do Idoso (CRI) Norte e o Instituto Paulista de Geriatria e Gerontologia (IPGG) José Ermírio de Moraes.
Claudia também abordou os estigmas sobre o envelhecimento ainda associado à decadência, dependência, inutilidade e proximidade da morte. Além dos desafios diante da heterogeneidade da população idosa, o aumento da expectativa de vida, famílias reduzidas, recursos escassos, baixa adesão a hábitos saudáveis e a falta de profissionais especializadas em envelhecimento.
Por isso, segundo Claudia, a necessidade de políticas pensadas para diferentes idosos que atinjam o maior número possível de pessoas. Claudia salientou que o importante é ser o seu melhor em qualquer idade e sempre é tempo de melhorar.
Moradia
Maria Cláudia da Costa Brandão, da Secretaria de Estado da Habitação, falou sobre moradia, destacando a reformulação do programa Vila Dignidade, agora denominado Vida Longa. Uma parceria entre a Secretaria de Habitação, responsável pelo repasse de recursos e os projetos e obras por meio da CDHU; a Secretaria de Desenvolvimento Social, que faz a coordenação e o trabalho social, e os municípios, que cedem os terrenos e são gestores dos equipamentos.
O novo programa, lançado no dia 1 de outubro, tem como foco o estímulo à convivência e criação de vínculos entre os moradores. Segundo Cláudia, há cinco projetos já licitados e os convênios devem ser assinados ainda este ano. Outros 18 projetos estão programados.
Transporte
Nos eixos temáticos, moradia e transporte foram trabalhados por um mesmo grupo. O palestrante da área de transporte foi Antônio Munhoz, da SP Trans, empresa responsável pelo transporte na capital paulista. Ele destacou a diferença entre transporte, relacionado aos veículos, e mobilidade, que engloba todo o processo de deslocamento. Tuca, como é conhecido, apresentou o programa Micro Acessibilidade. O foco prioritário são pessoas com deficiência e mobilidade reduzida.
A proposta do Micro Acessibilidade é construir rotas acessíveis que interliguem pontos de interesse e paradas próximos a Centros Especializados de Reabilitação da capital. Tuca afirmou que a falta de mobilidade e acessibilidade na cidade de São Paulo estão entre as principais causas de absenteísmo, que são as faltas a consultas e exames na rede pública.
As intervenções do Micro Acessibilidade foram feitas em dois pontos de São Paulo e incluem a reforma das calçadas com colocação de piso tátil e alargamento, e iluminação voltada para o pedestre. A nova política de mobilidade deve contemplar outros oito pontos em breve.
Assistência social
Marisa Accioly Rodrigues da Costa Domingues, assistente social e professora do curso de Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, também abordou políticas públicas. Segundo ela, e eu concordo, há um conjunto bom e sólido de políticas, o que falta é a implementação na maneira necessária para atender às necessidades da população idosa. Porém sem recursos, elas não se efetivam.
No conceito de aging in place, de manter a pessoa idosa pelo maior tempo possível no lar e na comunidade, Marisa destacou desafios como ter pessoas com quem contar e compartilhar, lugares acessíveis, serviços e produtos centrados na pessoa idosa e a capacitação de gestores e profissionais. E ainda a divisão da responsabilidade, como prevê o Estatuto do Idoso, entre a família, sociedade e o Estado. Diferente do que ocorre hoje, quando tudo recai sobre a família.
Previdência
Nos eixos temáticos, um mesmo grupo trabalhou proposta para Assistência Social e Previdência. A palestrante no tema Previdência foi Roberta Stoppa, assistente social do Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS). Ela abordou a implantação da Previdência no país desde 1933 quando o financiamento público não era para todos. Até que foi ampliada para todos com a Constituição Federal, se tornando uma política baseada na contribuição e obrigando à filiação.
Roberta também falou sobre o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que é vinculado à Assistência Social e atende idosos e pessoas com deficiência. Com o Estatuto do Idoso, a idade inicial de 70 anos para obter o benefício, foi reduzida para 65. Depois disso, o número de concessões registrou um aumento significativo. Entre 2003 e 2004 foi de 40%. Dados do mês de julho, segundo ela, mais de quatro milhões de pessoas beneficiadas no país.
Cultura, Lazer e Esporte
Cultura, Lazer e Esporte também foram debatidos por um mesmo grupo nos eixos temáticos. No subeixo Cultura, a palestrante foi Deise Guelfi, da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado, que há três meses está no Conselho Estadual. Ela diferenciou cultura de produtos culturais, sendo a cultura a herança social e um mecanismo adaptivo e cumulativo. Para Deise, a Cultura é o conjunto de ideias, comportamentos, símbolos e práticas e está sempre em desenvolvimento influenciada por novas maneiras de pensar, ganhando novos significados a cada nova geração.
Por outro lado, manifestações artísticas como teatro, dança, dentre outros, são produtos culturais. Segundo Deise, a palavra de ordem é inovar e conversar com as pessoas idosas sobre o querem enquanto cultura. É o que os especialistas sempre ressaltam construir com eles e não para eles.
Walkyria Fuga de Souza, da Secretaria de Esportes do Estado de São Paulo e suplente do Conselho Estadual do Idoso, falou da área de Esportes e apresentou os trabalhos desenvolvidos pelo órgão como o programa Vidativa, voltado para idosos de baixa renda. Os Jogos Regionais do Idoso, que chegou a 23ª edição este ano, também foram destacados. Embora o número de idosos venha crescendo, o número de participantes nas regionais tem ficado em torno de 14 mil pessoas. Ficou também o convite para o “1º Fórum de Recreação e Lazer do Estado de São Paulo”, que será realizado nos dias 3 e 4 de dezembro, na cidade de Serra Negra, vizinha a Águas de Lindoia.
Educação
Maria do Carmo Monteiro Kobayashi, professora da Unesp de Bauru, encerrou de forma brilhante a programação do primeiro dia da Conferência Estadual do Idoso. O eixo temático abordado por ela foi Educação. A professora destacou os diferentes ciclos da vida desde a infância quando começamos a aprender muitas coisas; a adolescência com transformações no corpo e na mente; e a maturidade, período de planejamento do futuro, construção da família, e quando se tem a percepção da velhice.
Casada há 41 anos, já com mais de 60 de idade, Maria do Carmo, mais conhecida como professora Kobayashi, disse que vive uma fase em que é “senhora de si”. E ressaltou o cuidado para que não se confunda a autoridade com autoritarismo. A primeira fundamentada na confiança e a segunda na força.
Segundo a professora, a velhice não é algo natural para a legislação. E entre os desafios da educação está vencer o estigma da velhice e estimular o aprendizado da pessoa idosa, melhorando sua autoestima; criar leis para o transporte acessível para salas de Educação de Jovens e Adultos, apoiar a implantação de universidades abertas à terceira idade públicas e privadas, e inserir nos currículos escolares conteúdos voltados ao processo de envelhecimento.
E como o tempo marca a vida, pelo relógio (Cronos) ou pelos momentos vividos (Kairós)? Prefiro, assim como ela, marcar meu tempo pelos momentos. “A vida só pode ser marcada pelas nossas lembranças e pelos eventos que nos marcaram”, afirmou, citando Rubem Alves. Outro ponto foi a importância da educação a longa da vida nos levando para outros mundos, conferindo o poder de escolher e mudar. (Katia Brito)