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Velhices e envelhecimento LGBTQIA+ em debate

As velhices e o envelhecimento da população LGBTQIA+ no Brasil foram tema de audiência pública realizada no dia 20 de maio pela Comissão dos Direitos da Pessoa Idosa (CIDOSO) da Câmara dos Deputados. A sugestão foi da ONG Eternamente Sou e o pedido foi apresentado pela deputada federal Tereza Nelma (PSDB-AL), que conduziu os trabalhos com apoio do deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG). A deputada é autora do Projeto de Lei 151/2021 que propõe a substituição das expressões “idoso” e “idosos” no Estatuto do Idoso por “pessoa idosa” e “pessoas idosas”.  

Claudio Nascimento, diretor de Políticas Públicas da Aliança Nacional LGBTI, abriu os debates. Segundo ele, um dos desafios, assim como a invisibilidade social, é que não se considera a sexualidade e a possibilidade de afeto e desejo na velhice. Ele também é coordenador executivo do Grupo Arco-Íris de Cidadania LGBTI do Rio de Janeiro e coordenador no Brasil da Rede Gay Latino.

A produção de caminhos de debate e promoção da inclusão em programas de envelhecimento saudável de prefeitura e Estados foram soluções apontadas por Nascimento. O cruzamento entre as legislações em defesa das pessoas LGBTI e idosos, segundo ele, poderia produzir políticas e programas que mudariam a realidade dessas velhices, formada por várias comunidades.  

Diego Felix Miguel, especialista em Gerontologia pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) e referência na temática, ressaltou o duplo sofrimento e a invisibilidade da pessoa idosa LGBT. Para ele, falta  representatividade, por isso é necessário criar um cenário que favoreça a inclusão, considerando as diferenças e a diversidade. Padrinho da ONG Eternamente Sou, salientou o trabalho pioneiro da organização dando voz para as velhices LGBT e abrindo espaço para a discussão tanto na área científica como em políticas públicas.

Saúde e pesquisa

Milton Crenitte, médico geriatra, coordenador do Ambulatório de Sexualidade da Pessoa Idosa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, e diretor de projetos da Eternamente Sou, apresentou sua pesquisa sobre as barreiras de acesso a saúde para a população LGBT 50+. Ele destacou a sobreposição de camadas de preconceito e discriminação, o que leva a menor vontade de procurar serviços, estimulada também por experiências negativas prévias. Segundo ele, são necessárias políticas públicas para reduzir as desigualdades e as vulnerabilidades nestas velhices.

Luís Baron, vice-presidente da Eternamente Sou, organização sediada em São Paulo, com núcleos no Rio de Janeiro e em Santa Catarina, falou sobre o trabalho realizado principalmente com foco no cuidado psicossocial, para promoção dessas existências diversas, melhorando a autoestima. De acordo com ele, o Estatuto do Idoso não menciona a sexualidade ou identidade de gênero e para a criação de políticas públicas são necessárias pesquisas.

Solidão e volta ao armário

Para Leticia Lans, psicanalista e especialista em Gênero e Sexualidade, a população LGBT é vista com reservas pela sociedade e pelo próprio gueto na velhice. Pessoas que são colocadas em processo forçado de abandono e esquecimento, sem o direito a se expressar e ser quem é, algo que não pode ser negado a ninguém. Segundo ela, nada é mais devastador na vida de uma pessoa LGBT idosa do que a solidão causada pela dificuldade em estabelecer relações ao longo da vida.

Marcelly Malta Lisboa, presidente da ONG Igualdade RS e da Associação de Travestis e Transexuais do Rio Grande do Sul, destacou que muitas pessoas LGBT são empurradas para a marginalidade e prostituição, e quando chegam a uma certa idade de volta para o armário. Ela mesma nunca pensou que chegaria aos 70 anos e hoje conta com um plano de saúde, mas esta não é a realidade da maioria que não é bem tratada nos serviços de saúde e acolhimento. Para ela, as políticas públicas precisam ser afirmativas, e os travestis e transexuais serem devidamente respeitados e incluídos.

Toni Reis, presidente da Aliança Nacional LGBT, afirmou que o grupo está começando com a pauta da pessoa idosa e deve se filiar a Eternamente Sou. Ele frisou a necessidade de sensibilização e capacitação das instituições de longa permanência para atender estas velhices e não obrigá-los a voltar para o armário, se adequando a filosofia do local, sem poder expressar seus sentimentos e sua identidade. Para ele, é preciso mostrar que não se trata de destruir a família de ninguém e a única apologia feita pelo grupo é pelo respeito e a aceitação.

O Projeto de Lei 94/2021, de autoria do deputado Alexandre Frota (PSDB-SP) busca “garantir que as entidades que desenvolvam programas de institucionalização de longa permanência às pessoas idosas exerçam suas funções de modo a preservar a dignidade dessas pessoas, respeitando-as independentemente de orientação sexual ou identidade de gênero”.

Governo

Antonio Costa, secretário nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, órgão ligado ao Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, falou sobre o atraso enorme de políticas públicas e que os avanços do Estatuto do Idoso devem ser colocados em prática. Para avançar, segundo ele, é preciso unir esforços e uma oportunidade para este diálogo está na formulação da Política Nacional de Cuidados.

A última a falar foi Marina Reidel, diretora de Promoção dos Direitos LGBT, do Ministério da Mulher. Ela ressaltou que é importante somar e trazer ideias, pensar de maneira propositiva, com disposição para construir juntos e juntas políticas para as velhices LGBT que sejam do Estado brasileiro. Um termo de cooperação técnica deve ser assinado com o Ministério da Saúde para retomar o programa de saúde integral da população LGBT.

(Imagens: Reprodução YouTube Câmara Federal)

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1 comentário

  1. Márcia Cristina Nobua Cruz diz:

    Tive a honra de poder acompanhar. É uma pauta de grande valor que merece ser discutida.

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